Pulo do Lobo

Um blog para os apreciadores do silêncio ...

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segunda-feira, abril 25, 2005

Com nove anos de idade


www.pulodolobo.blogspot.com Posted by Hello


Ainda me lembro dessa manha, há 31 anos, em que retiraram a moldura com a fotografia do ex-Presidente do Conselho ladeada que estava pelas fotografias de Marcelo Caetano e Américo Tomás na escola pública que frequentava. Mandaram-nos cedo para casa porque as informaçoes ainda nao eram muitas. Houve alguma parcimónia no final dessa manha mas à tarde já estavamos a fazer o que sabiamos melhor. Jogar à bola. A Cuf estava na 1° divisao e o Barreirense no sobe e desce. Mas, o Benfica e o Sporting é que contavam, o resto era só paisagem. No entanto, dado o carácer disciplinador da minha querida maezinha nao me safei aos trabalhos de casa , e se a professora nao tivesse marcado nada, arranjava-se sempre uma cópiazinha e duas ou três divisoes daquelas com números decimais seguido das respectivas provas. É que o exame da 4 ° classe estava aí à porta. E como se recordarao os mais velhos aqueles livros obrigavam as meninges a exercitarem-se com os nomes dos rios, serras, províncias ultramarinas, as séries dinásticas da realeza portuguesa e a infindável parafernália de reduçoes, provas dos nove , reais e sei lá que mais. Nao eram os boatos sucessivos nem sequer o regresso dos exilados de renome que me preocupavam no início do Verao desse ano mas sim a melhor forma de ser aceite na equipa que ia "roubar lenha" nos quarteiroes circundantes. A nossa fogueira tinha que ser a maior de todas!. E no intervalo, das intermináveis futeboladas contra a "malta lá de baixo" que ganhávamos quase sempre, ainda tinhamos que fazer os cartuchos, recorrendo às Corin Tellados que já se tinham democratizado, para a guerra de canudos nas ruínas das "casas velhas". Os mais velhos , no início da puberdade, alimentavam as suas pulsoes sexuais com as Ginas e Lolas que de repente apareceram por todo o lado. Nós, os mais novos, achávamos aquilo uma chachada e queriamos mesmo era jogar às sargetas ou fazer parte da equipa dos mais velhos que iam caçar pardais para vender na barraquinha dos comes e bebes. Os longos períodos a seguir ao almoço, irremediavelmente "a fazer a digestao", eram passados a ler Mundos de Aventuras, Enid‘s Blyton , Salgari‘s e um ou outro Jules Verne. Ao cair da noite, às escondidas, iamos colar cartazes dos mais variados partidos para no dia seguinte, invariavelmente, irmos ouvir o que o Tó Coxo, de todos o mais esclarecido políticamente, dizia sobre o Ti Pedro, o jardineiro , que afinal era informador da Pide e dos inúmeros inimigos da revoluçao e da classe operária que se escondiam na maioria daquelas 3° assoalhadas daquela zona ... No intervalo dessas sessoes de esclarecimento iamos jogar aos cantos para o portao da fábrica da cortiça e o Tó Coxo era quase sempre o guarda redes. E podia defender com as muletas... Eu e o Patilhas é que nao gostávamos de muitas confusoes e quando a malta era muita iamos para o portao de baixo treinar para, quando fóssemos grandes, nao lhes dar as mínimas hipóteses. Até ao dia em que o Patilhas , num dos seus famosos estoiros , partiu o braço dum tenrinho de que já nao me lembro o nome. Os Pais, esses, nunca mais deixaram o Patilhas vir brincar para a rua e eu perdi aquele que me podia continuar a ensinar as primeiras fintas à séria ...
Mesmo na esquina da rua transversal à minha abriu a sede do PRP/BR , o verdadeiro partido das massas operárias. Os seus membros, um deles era ( e é ) casado com uma prima minha pagavam-nos uns gelados daqueles de gelo e corante e nós toca de colar cartazes a apelar à luta armada e à tomada do poder pelo Povo. O Tó Coxo era mais UDP mas , como o PRP/BR, culpava o PCP pelo rumo dos acontecimentos. Nós , iamos para o Parque jogar ao "espeta", às covinhas ( nao gostava muito porque os mais velhos abafavam-me sempre os melhores papas que conseguia ganhar aos domingos quando ia esperar os pombos para o pé do quartel dos bombeiros do Barreiro ) e ao "lá vai alho" até que a chegada dos vauxhall‘s, fiat‘s 124, opel‘s rekord, e ford’s capri dos nossos pais nos obrigassem a dar uma corrida por aquelas calçadas , onde ainda tinhamos presente o troar do galope dos cavalos da GNR, para ter tempo de lavar os pés e as maos antes de nos sentarmos à mesa para jantar ...

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

muito bem escrito.

5:27 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Fabulosa descriçao desses anos cinzentos. Parabéns

5:39 da tarde  

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